Eu sou

Martha Medeiros me instigou com seu texto Quem sou eu?. Vou responder, por mim. Eu sou mais crônica que poesia, mais a objetividade do Twitter que o fuça-fuça do orkut. Eu sou mais discrição e menos descrição. Eu sou cabelo liso, escuro e curto. Eu sou jeans e all star nos fins de semana e camisa e scarpin de segunda a sexta. Eu sou esmalte vermelho, eu sou aliança no dedo indicador, eu sou parágrafos longos com frases curtas. Eu sou um poema não concluído, uma música com acordes fáceis, mas com ponte que muda de tom e complica. Eu sou alguém que ama apressado e rapidamente desama. Eu sou romances clássicos e crônicas modernas. Eu sou isso que você vê. Eu sou aquilo tudo que você não vê. Eu sou factual. Eu sou meu prato favorito, sou comida agridoce, sou salada com molhos nada ligths, sou fastfood com grelhado. Eu sou um paradoxo. Eu sou café, bolo, chá com gengibre. Eu sou muitas certezas e uma dúvida: minhas certezas estão certas? Eu sou um cd com o melhor do Cazuza, com os clássicos da música brasileira interpretados pelo mais novo cantor de mpb do país. Eu sou o caderno cultural dos jornais, eu sou uma pós incompleta, um mestrado com medo, eu sou uma filha desatenta, uma namorada esquecida, uma irmã calma, uma funcionária quieta. Sou mais inverso, sou banho quente, sou hidrantes, perfumes, vários travesseiros pra dormir. Sou edredon até no verão. Eu sou sono de manhã e disposição à noite. Sou quarto bagunçado. Sou quarto com estante, sala sem sofá, almofadas pelo chão. Sou filmes não muito comerciais, sou shows quase vazios. Eu sou da solidão, não de multidão. Sou memória curta. Sou post it´s e agendas. Sou cadernos, livros, bolsas, blusas e canetas. Sou mais cama que sofá. Sou mais eu que ele. Sou mais razão que emoção, há quem discorde. Eu sou mais tempo nublado. Sou mais perguntas que respostas. Mais poesia que jornalismo. Mais música que dança. Mais teatro que cinema. Sou paredes sem quadros, com adesivos. Eu sou mais a letra J que a letra L, há quem entenda. Eu sou uma amiga com preguiça de ser amiga, uma pessoa egoísta, eu sou um pouco do que não gostaria de ser, e um outro tanto do que eu exatamente gostaria de ser. Eu sou mais sincera do que suportam, menos observadora que deveria, sou mais crítica do que meu conhecimento me embasa. Eu sou assim, um texto todo, sem parágrafos internos. Eu, quando apaixonada, sou mais mpb, quando triste, mais rock n' roll. Eu sou mais violão que contrabaixo (confesso). Eu sou aliás, um monte de confissões não feitas. Sou o amor que declarei cedo demais, sou o amor incondicional que acabou assim que eu descobri que ele não me amava. Eu sou uma ligação não feita, uma carta não escrita, um email lindo na caixa de rascunho. Eu sou uma pessoa incerta, doida e compreensiva. Só não compreendo a mim mesma. Só não suporto a incerteza alheia, só me permito a doidera contida. Eu sou um monte de proibições que inventei: chocolate só de manhã, ligar para ele só uma vez por semana, faltar à aula só uma vez a cada dois meses, dizer que amo nem sempre que eu sentir vontade. Eu sou um monte de regras que não cumpro. Eu sou e isso basta. Eu sou citações de Clarice, Caio Fernando, Martha Medeiros, Machado de Assis, Adélia Prado e Carpinejar. Sou Los Hermanos, Muse, Oasis, Square, Gadu, Luiza Possi, Seu Jorge, o novo cd da Sandy. Eu sou uma entrevista não respondida, uma matéria sem fonte, um vídeo sem edição. Sou os amores que não tive. Sou o amor que tenho. Sou os nãos que já disse, os nãos que já ouvi. Eu sou incompleta na minha completude. Eu sou. Eu me permito ser nada do que meus pais esperavam, melhor que o meu namorado esperava, menos do que meus amigos queriam, melhor do que o mundo merece. Eu me permito ser exatamente como sou. Eu sou uma permissão, uma concessão, uma chance. Eu sou uma tentativa, um sucesso, um fracasso, eu sou um monte de palavras desconexas que para alguns fazem todo sentido. Eu sou e sinto o que sou. O segredo não é só ser é sentir quem se é. Eu me sinto, da mesma forma que sinto o outro. Eu sou concreta, embora abstrata, eu sou confusa embora saiba me explicar, eu sou sozinha quando acompanhada e acompanhada quando só. Eu sou mais reticências que ponto final. Eu sou mais aspas que travessão. Eu sou uma força frágil. Eu sou um doce amargo no final. Eu não canso de falar de mim, eu não canso de me descobrir. Eu sempre tenho algo a mais pra dizer, pra sentir, pra ser. Aqui estou eu em outro texto falando de mim, é que ultimamente eu sou meu assunto favorito. Eu sou.


Luana Gabriela
10/06/2010
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