Si doux comme un petit-four - Tiê

Como em qualquer dia chuvoso, ficava quieto, mas era assim também nos dias ensolarados. O silêncio era sua maior companhia, até que o riso dela lhe acordava. De onde veio aquele encanto todo que ela tinha, e ele não conseguia esquecer? De onde ela lhe trouxera aquela vontade de viver? Cansado de tentar descobrir, rendeu-se sem mais porquês. Descobrindo que amar é não saber, não compreender. Encontravam-se e relembravam os momentos tantos, e procuravam achar onde tudo havia começado. Ela confessava: Desde sempre eu te quis pra mim. E aquilo embora insano, dada as diferenças de gostos e planos, lhe fez cócegas no ouvido e no ego. Ela havia despertado o monstro que nele habitava. Era à noite que aquele monstro bonito saía. E falava sobre beijos, abraços, cumplicidade. Que monstro há que saiba ser necessária antes de tudo e qualquer coisa essa tal de cumplicidade? Só ele. É que naquele monstro habitava agora um tanto a mais de vida, que pode lhe trazer morte. Tornando infinito o paradoxo que é viver. Que amor é este que faz viver e quase mata? Não era mais possível ser totalmente racional, como ambos gabavam-se de ser. Este é um conto de dois amigos que de tão diferentes descobriram-se iguais. Que de tão racionais descobriram-se apaixonados. E apesar de ser curto, não tem fim. Como parecem não ter alguns dias chuvosos e aquele silêncio cúmplice dos dois.

Luana Gabriela
27/07/2010

Brisa doce no Vento com Som de Riso  (passa lá pra sentir o toque suave de um suspiro apaixonado)

No dia depois de amanhã

Não há nada mais belo que um sorriso de dia seguinte.

Luana Gabriela
27/07/2010

No dia depois de amanhã

Não há nada mais belo que um sorriso de dia seguinte.

Luana Gabriela
27/07/2010

Sujeitos transitivos indefinidos

Sou jornalista. O ponto talvez seja precipitado: ser jornalista não é dizer tudo e a frase precisa de complemento. Talvez, então, eu seja um objeto indireto. Sou jornalista e gosto de escrever. O que busco? Melhorar meu texto, o texto de dentro, que é quem eu sou e os textos que escrevo, que fazem parte de mim. Como diria Clarice Lispector, o que escrevo já está, de certa forma, escrito em mim.

Se eu pudesse, viveria para a literatura e de literatura, mas não posso. Afinal quem é que pode dizer, ainda novo, que sua profissão é escritor? Acredito que ninguém. A profissão escritor também precisa de complemento, escritor e professor, escritor e jornalista. Até Drummond, com sua quase incontestada genialidade lírica, tinha complemento: escritor e funcionário público.

Concluo, e aí posso precipitar-me novamente, que o verbo escrever é transitivo, ora direto, ora indireto. E que todo escritor é um objeto indefinido, já que ora é direto, ora indireto. A indefinição é que faz a escrita.



25 de julho - Dia Nacional do Escritor

Cause I understand, Do you?

Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo.


Clarice Lispector

Diálogo

Ela: Eu te amo, sabia?
Ele: Eu te amo mais.
Ela: Pode ser, mas eu te amo com tudo que posso.
(...)


Luana Gabriela
17/07/2010

Diálogo

Ela: Eu te amo, sabia?
Ele: Eu te amo mais.
Ela: Pode ser, mas eu te amo com tudo que posso.
(...)


Luana Gabriela
17/07/2010

-Verdades que tanto guardei -

Quando você chegou eu não acreditava mais no amor. Quando você chegou era tudo muito cinza aqui dentro. Quando você chegou eu não chovia, mas estava alagada de lágrimas que não chorei. Quando você chegou eu estava acostumada a atravessar as ruas sozinha, a não precisar de um boa noite para dormir, de um bom dia para realmente acordar. Quando você chegou eu achava o amor uma mentira das grandes, achava um absurdo esses casais que começam a ficar juntos e já dizem amar. Quando você chegou eu desacreditava de qualquer poema, de qualquer música de amor, eu só sabia desacreditar. E então você chegou. E teu sol brilhou pra mim - foi o primeiro texto que te escrevi (depois que você voltou). As lágrimas que não chorei (que me alagavam por dentro) o calor do teu Sol secou. A escuridão que eu tinha em mim o brilho do teu Sol dispersou. E mesmo hoje, quando algo me deixa triste, o encontro das minhas lágrimas de tristeza com o teu Sol, produz um arco-íris dentro de mim, e eu fico mais bonita mesmo quando triste. Depois que você chegou eu só penso em como eu pude resistir tanto tempo, e porque demoramos tanto pra nos rendermos. Depois que você chegou é pelos teus olhos que gosto de me ver, porque você me vê de um jeito que nem eu compreendo e na verdade nem quero compreender. Antes de você chegar eu não gostava dessa coisa de dizer onde e com quem estou. Agora que você chegou eu sinto vontade dedizer o tempo todo onde e com quem estou, só pra que você saiba que mesmo longe estou pensando em você, e que eu preferia estar contigo que em qualquer outro lugar com qualquer outra pessoa. Depois que você chegou fica uma vontade guardada de segurar a tua mão durante a madrugada, de dividir o sofá num domingo entediante, de dividir cada segundo, cada detalhe contigo, de fazer nada juntos. Fica só um imenso desejo de gritar ao mundo aquela frase presa que um dia eu te falei, mas como eu não posso, então eu sussurro pra só você ouvir: Eu te amo.


Luana Gabriela
15/07/2010

Sussurro apaixonado também no Vento com Som de Riso. Chega mais perto se quiser ouvir.

Desculpo

Ele me pediu desculpa por bagunçar o meu cabelo.
Desculpei.
Afinal ele já tinha bagunçado toda a minha vida mesmo.


Luana Gabriela
14/07/2010

Desculpo

Ele me pediu desculpa por bagunçar o meu cabelo.
Desculpei.
Afinal ele já tinha bagunçado toda a minha vida mesmo.


Luana Gabriela
14/07/2010

Eu não entendo

Por que você não disse que viria?

Logo agora que eu tinha
Me curado das feridas
Que você abriu quando se foi
Por que chegou sem avisar?
Eu queria tempo pra me preparar
Com a roupa limpa, a casa em ordem
E um sorriso falso pra enganar
Eu não entendo a sua volta
Não entendo a sua indecisão
Num dia sou seu grande amor
No outro dia não.
(Eu Não Entendo - Nenhum de Nós)
 
Qualquer um poderia reparar naquilo que ele lhe fazia. Aquele sorisso escondido entre um olhar e outro. Aquelas mãos que se tocam no escuro e aqueles olhos que se procuram no claro. Não era amor, mas era quase. Aquela saudade de tê-lo por perto, uma vez na semana era pouco. Pensava em se mudar para casa dele, o mais breve, na verdade apareceria por lá num final de semana. Roupas de frio e escova de dente. Um livro e um caderno em branco, no quarto um violão, e aquele quase amor.

Foi muito o tempo que esperaram para poder viver aquele sentimento, que antes nem sabiam tê-lo. Ele dizia amor. Ela dizia gostar muito. Embora o chamasse de amor, quando ele não estava perto. É que havia dias, nestes cinzas, chuvosos de inverno em que sonhava tê-lo por perto, e tinha uma vontade enorme de tê-lo e só. E nesses dias ela o amava. E amava hoje. E cada dia declarava: Te amo hoje. Por saber da incerteza dos sentimentos que carregava. Amor não é certeza, é não saber.

Ainda mais que voltavam e iam com a frequência alterada. De quem retorna ao porto depois de uma loonga viagem, cansados. Mas encontravam um no outro aquele refugio, aquele cais, um porto, um lar. Habitavam-se. A solidão dela, a solidão dele, refugiavam-se na solidão alheia. Materializava-se o amor, naquele instante. Mesmo sem expressarem-se aquele risos, aquele silêncio, as mãos suavando, a respiração ofegante parecia mesmo que o Eu te amo queria pular à garganta, chegar a boca do outro, e adentrando aquele corpo fosse morar no coração.

Ela dizia sempre que não tinha coração, mas o Eu te amo dele subiria à mente. E infectaria de amor todos os neurônios e volataria à boca dela, pra ele e num ciclo amoroso sem fim. Mas o fim sempre chega e tem um começo. Pra ela o fim começa quando ela entende que hoje acaba, e por isso ela sempre diz que ama hoje, amanhã não sabe. E desse jeito vai cumprindo sua promessa de amar hoje, só por hoje. Como aqueles encontros de alcóolicos anônimos, ou das mulheres que amam demais. Ela fundaria um novo: das mulheres que amam na medida certa. Nem mais nem menos. Mas surgiu-lhe uma dúvida: isso era mesmo amor? Indecisão.

Luana Gabriela
13/07/2010

Texto de reestreia no Postagem Coletiva. Leia outros textos aqui.

Atalhos

Claro que me alegro com tua chegada e me entristeço com tuas constantes partidas. Claro que me encanta essa coisa boa de dar as mãos, sorrir e falar de amor, de nós, da vida. Claro que te escrevo agora pensando em você, como você previa. Claro que só te digo o que sinto. Aproveito e peço-te perdão pelo meu silêncio em resposta aos teus dizeres.

Não é que eu não acredite no que sente, ou no que diz, é que não acredito no sentimento mesmo. Prefiro que me digas que gosta muito. É porque gostar muito também gosto, amar sei que não amo. Embora esteja amando isso de sermos a gente. Isso de ter de ajustar as agendas, de ter de esconder-mo-nos do mundo, para viver um pouco mais essa felicidade clandestina, como já disse Clarice.



Mas que felicidade não é clandestina? De todos os que conheço, e estão felizes nesse momento, nenhum tem indícios do que vive nem no sorriso, nem no olhar.Também não tenho. Não é por nada, é só por tudo, compreende? Se me dizes que penso demais, eu então te faço um pedido: faça-me sentir mais e pensar menos.

Somos diferentes, concordamos nisso e todo o mundo também o concordaria se nos conhecesse como um só. Não é a materialização de que os opostos se atraem é justamente a materialização de que é possível ser igual sendo diferente. Compreendes? Um drama, como daqueles mexicanos ou manchete dos jornais mais sensacionalistas.



Sangramos nossa solidão, a sós, a dois. Mesmo juntos não somos um porque não nos completamos. Porque vamos a direções opostas e nem quando temos nossas mãos entrelaçadas com toda a nossa força, e nem quando o relógio parece estar a nosso favor, não nos enganemos, a eternidade bate à porta. Então de medo, para te ninar e para fingir que não a ouvimos bater, eu canto pra você. E desafino, só pra te provar que eu não sei cantar. Fico em silêncio, só pra te provar que ouço o que não quero, mas não falo o que quero. Embora eu escreva: às vezes sinto mesmo uma vontade imensa de você. Mas então surge-me à mente os domingos à noite em que não estarás comigo. Os sábados que terei de dividir, amor, amigos, eu.



Tenho pouco dentro de mim. De amor, de confiança, de fé. É pouco, sei disso. Mas é tudo que tenho para te dar. Se te ofereço minhas mãos, meu sorriso, meu olhar, se te ofereço meu abraço, é porque acho que você pode aceitar o que restou de quem eu fui. Mas especialmente porque me aceitas tendo-me conhecido numa de minhas fases mais bonitas, mas me vens e me aceitas com toda essa escuridão por dentro, com todas as lágrimas que não me permiti chorar. E com este medo todo, elevado ao quadrado. E te mostro meu pior esperando que vás embora, mas então você fica. Você me abraça, me beija, me segura pela mão e me diz: Vamos fugir? Te respondo que não, há uma vida toda além de nós e decido levantar-me e partir, por não querer ver o fim dessa conversa, onde tudo isso que você me dá pode me levar. Caminho desconhecido, prefiro os atalhos e sei que o fim é sempre certo. Vamos ao fim logo, meu atalho é o medo, o seu; desejo.




Luana Gabriela
12/07/2010
"Eu que nunca discuti o amor
Não vejo como me render
Ah, será que o tempo tem tempo pra amar?
Ou só me quer tão só?
E então se tudo passa em branco eu vou pesar
A cor da minha angústia e no olhar
Saber que o tempo vai ter que esperar"
Móveis Coloniais de Acaju - O Tempo

Como dois estranhos

Você passou por mim, sem me cumprimentar.
Não é mais preciso.
Depois do que vivemos, conclui:
Eu nunca te conheci e você jamais me reconhecerá.

Luana Gabriela
27/04/2010

Como dois estranhos

Você passou por mim, sem me cumprimentar.
Não é mais preciso.
Depois do que vivemos, conclui:
Eu nunca te conheci e você jamais me reconhecerá.

Luana Gabriela
27/04/2010

Quando fico em silêncio me escondo na palavra alheia

Tenho trabalhado tanto, mas penso sempre em você. Mais de tardezinha que de manhã, mais naqueles dias que parecem poeira assentada aos poucos e com mais força enquanto a noite avança. Não são pensamentos escuros, embora noturnos. Tão transparentes que até parecem de vidro, vidro tão fino que, quando penso mais forte, parece que vai ficar assim clack! e quebrar em cacos, o pensamento que penso de você. Se não dormisse cedo nem estivesse quase sempre cansado, acho que esses pensamentos quase doeriam e fariam clack! de madrugada e eu me veria catando cacos de vidro entre os lençóis. Brilham, na palma da minha mão. Num deles, tem uma borboleta de asa rasgada. Noutro, um barco confundido com a linha do horizonte, onde também tem uma ilha. Não, não: acho que a ilha mora num caquinho só dela. Noutro, um punhal de jade. Coisas assim, algumas ferem, mesmo essas que são bonitas. Parecem filme, livro, quadro. Não doem porque não ameaçam. Nada que eu penso de você ameaça. Durmo cedo, nunca quebra.

Daí penso coisas bobas quando, sentado na janela do ônibus, depois de trabalhar o dia inteiro, encosto a cabeça na vidraça, deixo a paisagem correr, e penso demais em você. Quando não encontro lugar para sentar, o que é mais freqüente, e me deixava irritado, descobri um jeito engraçado de, mesmo assim, continuar pensando em você. Me seguro naquela barra de ferro, olho através das janelas que, nessa posição, só deixam ver metade do corpo das pessoas pelas calçadas, e procuro nos pés daquelas aqueles que poderiam ser os seus. (A teus pés, lembro.). E fico tão embalado que chego a me curvar, certo que são mesmo os seus pés parados em alguma parada, alguma esquina. Nunca vejo você – seria, seriam? Boas e bobas, são as coisas todas que penso quando penso em você. Assim: de repente ao dobrar uma esquina dou de cara com você que me prega um susto de mentirinha como aqueles que as crianças pregam umas nas outras. Finjo que me assusto, você me abraça e vamos tomar um sorvete, suco de abacaxi com hortelã ou comer salada de frutas em qualquer lugar. Assim: estou pensando em você e o telefone toca e corta o meu pensamento e do outro lado do fio você me diz: estou pensando tanto em você. Digo eu também, mas não sei o que falamos em seguida porque ficamos meio encabulados, a gente tem muito pudor de parecer ridículos melosos piegas bregas românticos pueris banais. Mas no que eu penso, penso também que somos meio tudo isso, não tem jeito, é tudo que vamos dizendo, quando falamos no meu pensamento, é frágil como a voz de Olívia Byington cantando Villa-Lobos, mais perto de Mozart que de Wagner, mais Chagal que Van Gogh, mais Jarmush que Win Wenders, mais Cecília Meireles que Nelson Rodrigues.

Tenho trabalhado tanto, por isso mesmo talvez ando pensando assim em você. Brotam espaços azuis quando penso. No meu pensamento, você nunca me critica por eu ser um pouco tolo, meio melodramático, e penso então tule nuvem castelo seda perfume brisa turquesa vime. E deito a cabeça no seu colo ou você deita a cabeça no meu, tanto faz, e ficamos tanto tempo assim que a terra treme e vulcões explodem e pestes se alastram e nós nem percebemos, no umbigo do universo. Você toca minha mão, eu toco na sua.

Demora tanto que só depois de passarem três mil dias consigo olhar bem dentro dos seus olhos e é então feito mergulhar numas águas verdes tão cristalinas que têm algas na superfície ressaltadas contra a areia branca do fundo. Aqualouco, encontro pérolas. Sei que é meio idiota, mas gosto de pensar desse jeito, e se estou em pé no ônibus solto um pouco as mãos daquela barra de ferro para meu corpo balançar como se estivesse a bordo de um navio ou de você. Fecho os olhos, faz tanto bem, você não sabe. Suspiro tanto quando penso em você, chorar só choro às vezes, e é tão freqüente. Caminho mais devagar, certo que na próxima esquina, quem sabe. Não tenho tido muito tempo ultimamente, mas penso tanto em você que na hora de dormir vezemquando até sorrio e fico passando a ponta do meu dedo no lóbulo da sua orelha e repito repito em voz baixa te amo tanto dorme com os anjos. Mas depois sou eu quem dorme e sonha(...).


Caio Fernando Abreu
“Carta Anônima”
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